Cyro Fiuza
O golpe de morte no Jockey Club de São Paulo desferido na última semana pela Câmara Municipal, com aval da Prefeitura, é a crônica anunciada do destino que aguarda o centenário clube de corridas. Se agora foi um PL que proíbe a realização de corridas com apostas, ano passado foi a aprovação do projeto que transformou o Hipódromo Paulistano em parque público.
Embora tenha se pronunciado - apenas dois longos dias após a votação na Câmara - a atual diretoria do Jockey, tendo à frente o empresário Benjamim Steinbruch, vem repetindo o mesmo modo de agir de um clube que parece "fechado" por não divulgar o turfe, não promover ações sociais em suas instalações, não interagir com a população e com os políticos de São Paulo, sobretudo os vereadores que costumavam prestigiar os grandes prêmios.
Ações sociais e urbanísticas com bom propósito, como restaurar partes das edificações tombadas pelo patrimônio público, sempre se mostraram tímidas, muito aquém do potencial do turfe e do tamanho do hipódromo. Nos anos 2000, durante as duas gestões do empresário Márcio Toledo à frente do clube, alguns sócios repetiam um mantra nos salões do clube quando da realização dos grandes prêmios: "não gostamos de políticos".
Toledo costumava dizer: "é preciso derrubar os muros do Jockey", utilizando uma figura de linguagem do papel que o clube deveria cumprir junto à cidade. Passaram por lá Lula, Alckmin, FHC, Aecio, José Alencar, Mário Covas e muitos outros. Passaram-se mais 15 anos e agora, quando precisou dos políticos, o Jockey Club percebeu que não os conhecia mais.
E por falar nos políticos... A votação e aprovação da proibição das corridas tem falhas gritantes. A começar pelo turfe ser regido por lei federal, de 1984, que vale para a atividade em todo o país. Mas o fato de legislar em projeto que não lhe diz respeito ou então algo estapafúrdio não surpreende em se tratando da Câmara Municipal de São Paulo. Em ano eleitoral, a Casa está mais inclinada a "causar" do que resolver graves problemas da capital, como encontrar solução para o drama da Cracolândia.
Há poucos dias, os vereadores votaram e aprovaram em primeira instância talvez o maior absurdo que já se viu no Palácio Anchieta: proibir a população de dar comida aos moradores de rua. A coisa pegou tão mal que o prefeito Ricardo Nunes, pressionado às vésperas de uma eleição municipal, já adiantou que vai vetar o projeto caso seja aprovado em segundo turno.
Voltando ao hipódromo... diante de duas leis votadas com diferença de poucos meses, e que somadas decretam o fechamento do Hipódromo Paulistano, quais podem ser os próximos passos dessa novela? Por parte da direção do Jockey Club, é esperada uma reação na Justiça, uma vez que há uma legislação federal que rege as corridas de cavalo. Outro argumento válido é que a Prefeitura deve uma boa quantia ao clube por conta da desapropriação da Chácara do Ferreira, em 2016.
Da parte da Prefeitura, o que pode acontecer agora? Uma destinação é a transformação da área no Parque João Carlos Di Gênio, conforme previsto pela lei que desapropria o hipódromo. Há uma parte do patrimônio que é tombada, caso do conjunto das três arquibancadas, e que provavelmente seria incorporada ao futuro parque. Mas há também um espaço, que englobaria as duas extremidades do terreno, próximo às pontes Eusébio Mattoso e Cidade Jardim, que estaria apto à construção de prédios, residenciais ou comerciais, após recentes mudanças na legislação e no Plano Diretor da cidade.
A pergunta que fica é: a quem pertencerá os direitos de construir? Ao poder público, à uma concessão que receberia a área em leilão ou licitação, ou à diretoria e aos sócios do Jockey Club? Parque público, complexo residencial/empresarial ou alguma outra novidade que surja pelo caminho?
Em março deste ano, IPO News publicou matéria sobre a construção de um complexo de entretenimento com valor estimado em US$ 3 bilhões, com direito até a cassino, no hipódromo. O Jockey Club não se manifestou sobre o assunto, mas uma agência de publicidade e eventos do Rio de Janeiro confirmou à reportagem a existência do projeto.