Anna Satie
Para o cientista político Antonio Lavareda, não foi a consciência das Forças Armadas, mas a posição do governo dos Estados Unidos que frustrou os planos golpistas para manter Jair Bolsonaro (PL) no poder em 2022.
Em entrevista ao UOL, o analista disse que os comandantes brasileiros não podem levar o crédito pela manutenção da democracia quando as investigações mostram que eles tinham conhecimento prévio da trama e não fizeram denúncia alguma.
Ele destaca que, durante o processo eleitoral daquele ano, enviados pelo presidente Joe Biden se reuniram com os chefes das Forças Armadas e deixaram claro que o país não apoiaria uma ruptura institucional.
Forças Armadas do Brasil e dos EUA têm ligação histórica
Em julho de 2022, Lloyd Austin, secretário de Defesa norte-americano, e a general Laura Jane Richardson, chefe do Comando Sul do Exército dos EUA, se encontraram com o general Paulo Sérgio de Oliveira, então ministro da Defesa e ex-comandante do Exército brasileiro. O compromisso aconteceu dias após a reunião com embaixadores convocada por Bolsonaro, em que ele questionou, sem provas, a integridade do processo eleitoral brasileiro.
Foram essas reuniões, também motivadas pela bancada democrata do Congresso norte-americano, que despertaram uma análise de custos e benefícios de uma eventual iniciativa nessa direção [golpista]. Lloyd Austin e Laura Jane deixaram claro que seriam rompidos os acordos militares e que haveria um afastamento do governo norte-americano do país que emergiria dessa ruptura institucional.
O Exército brasileiro tem uma ligação histórica com o dos Estados Unidos, aprofundada sobretudo a partir da Segunda Guerra, um grande número de tratados, apoio, manobras militares e treinamentos conjuntos. Além disso, os EUA são a principal potência do ponto de vista ocidental e do chamado mundo democrático. O golpe de 1964 teve o apoio norte-americano como uma coisa fundamental.
No entanto, os motivos que levaram os chefes militares a adotar uma função legalista é menos importante do que o comportamento que eles tiveram. Se foi uma lógica cautelar ou um pouco de convicção, não importa. É importante valorizar a postura legalista.
Para sintetizar a minha posição, se a gente precisar construir um monumento de homenagem a um herói da resistência, que evitou o golpe, vai ser uma heroína, a general Laura Jane. Foi a presença dela aqui, a mando de Joe Biden, que de fato teve impacto dissuasório.
Foram essas reuniões, também motivadas pela bancada democrata do Congresso norte-americano, que despertaram uma análise de custos e benefícios de uma eventual iniciativa nessa direção [golpista]. Lloyd Austin e Laura Jane deixaram claro que seriam rompidos os acordos militares e que haveria um afastamento do governo norte-americano do país que emergiria dessa ruptura institucional.
O Exército brasileiro tem uma ligação histórica com o dos Estados Unidos, aprofundada sobretudo a partir da Segunda Guerra, um grande número de tratados, apoio, manobras militares e treinamentos conjuntos. Além disso, os EUA são a principal potência do ponto de vista ocidental e do chamado mundo democrático. O golpe de 1964 teve o apoio norte-americano como uma coisa fundamental.
No entanto, os motivos que levaram os chefes militares a adotar uma função legalista é menos importante do que o comportamento que eles tiveram. Se foi uma lógica cautelar ou um pouco de convicção, não importa. É importante valorizar a postura legalista.
Para sintetizar a minha posição, se a gente precisar construir um monumento de homenagem a um herói da resistência, que evitou o golpe, vai ser uma heroína, a general Laura Jane. Foi a presença dela aqui, a mando de Joe Biden, que de fato teve impacto dissuasório.
A comandante do Comando Sul do Exército dos EUA, Laura Jane Richardson, e o secretário de Defesa norte-americano, Lloyd Austin Imagem: SD Santana Brito/ESG e Embaixada dos Estados Unidos no Brasil/Divulgação
Fatos tendem a desmentir suposto "heroísmo" do Exército
Os generais Freire Gomes e Valério Strumpf Trindade foram atacados nas redes sociais por parte de seus pares e militantes bolsonaristas, por terem se oposto ao plano de golpe de Estado em 2022. Mas, para Lavareda, eles não foram "heróis".
Essa coisa de heroísmo, de convicções democráticas, acho que os fatos tendem a desmentir. Eles tinham a obrigação de ter denunciado. Se houve uma proposta que era de um comportamento ilegal, eles tinham que ter denunciado.
A explicação dada foi que eles silenciaram para não terem de se afastar dos cargos e serem substituídos, e o Bolsonaro, então, ter êxito. Mas isso resiste como argumento até o dia 31 de dezembro. E no novo governo? Por que não denunciaram isso? E depois do 8 de Janeiro? Em suma, por que só denunciaram depois da delação do Mauro Cid? O depoimento do Mauro Cid foi o deflagrador das convicções democráticas?
Há dois possíveis crimes: o de prevaricação e o de condescendência criminosa -é o crime do agente público que deixa de responsabilizar subordinados que cometeram infrações. Alguns poucos podem ser punidos, ao final. Mas, mesmo sendo poucos, será de uma importância histórica, de exemplaridade.
Cenário seria outro com Trump
Na avaliação do pesquisador, esse episódio não teria acontecido se Donald Trump estivesse na Casa Branca em 2022.
Trump provavelmente não mandaria [essa comitiva para o Brasil]. Trump era, é aliado do Bolsonaro. Ele não mandaria ninguém aqui se manifestar contra eventuais rupturas institucionais se elas fossem comandadas pelo Bolsonaro.
"[Se houver um novo risco golpista], não haverá manifestação do governo dos EUA, não se for patrocinado por qualquer setor ligado a Bolsonaro. Ou seja, você tem um risco aí o tempo todo. A partir de agora, temos um risco.
Uol
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2024/12/08/quem-evitou-golpe-em-2022-foram-os-eua-entrevista-antonio-lavareda.htm