Governador quer tirar corregedorias de dentro das polícias, vai pilotar troca de câmeras nas fardas e determina mudanças na Operação Verão
Por Vera Magalhães
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, manterá Guilherme Derrite como secretário de Segurança Pública, mas começará a semana "dentro" da pasta, na definição de pessoas próximas. Ele vai acompanhar de perto a implementação de uma série de medidas que estão sendo classificadas como de correção de rumos depois da explosão de casos de violência, sobretudo envolvendo policiais militares, nos últimos meses. Embora ninguém vá usar o termo, trata-se de uma intervenção branca na secretaria.
Depois de admitir em mais de uma ocasião ao longo da semana passada, quando alguns dos casos mais escabrosos vieram à tona, que estava errado quanto as câmeras nos uniformes dos policiais, e de reconhecer que palavras suas podem ter sido entendidas como endosso à violência, e isso tem peso, o governador cancelou uma ida a Brasília, nesta terça-feira, para acompanhar uma série de testes com novos equipamentos de câmeras corporais com inovações tecnológicas, como a possibilidade de acionamento remoto por parte dos comandos das tropas e a possibilidade de funcionarem também como meio de comunicação entre os policiais e as centrais.
A ideia é anunciar o aumento das atuais 10,2 mil câmeras para 15 mil. O teste será feito com equipamentos da Motorola, mas há outros fabricantes que estão sendo contatados para futuras aquisições.
Nos próximos dias também deverá ser anunciado um incremento no número de bases comunitárias da Polícia Militar na capital e na Baixada Santista. Isso porque a Operação Verão, que deixou 56 civis mortos pela PM neste ano, vai se repetir no início de 2025. O discurso no governo é que a ação, cuja justificativa é o combate ao crime organizado no litoral, será marcada pela presença ostensiva da polícia por meio das bases, sem a necessidade de operações ostensivas nas comunidades.
Nos próximos dias o governo deve anunciar novas medidas de acompanhamento psicológico de policiais e de treinamento para o uso de armas não-letais e de atuação em diferentes tipos de abordagem. Também serão anunciados novos convênios com municípios no programa Muralha Paulista, de fornecimento de câmeras de ruas para monitoramento.
A intervenção branca na Secretaria de Segurança Pública deve incluir a definição de uma política pública para a área bem diferente daquela preconizada por Derrite, que foi comandante da Rota. Tarcísio ficou bem impressionado com a intervenção da professora da Fundação Getúlio Vargas Joana Monteiro, especialista em segurança, num seminário na última sexta-feira, e pretende convidá-la para desenhar ideias que poderiam ser adotadas em São Paulo. O blog, no entanto, apurou depois da publicação deste post que, embora tenha falado com ela no final do evento, Tarcísio não fez convite algum à professora.
Nos últimos dias, ele teve algumas conversas com Derrite. A decisão de manter o secretário não significa que a relação entre os dois esteja no melhor momento. Aliados que acompanham a evolução na crise da segurança lembram que o estilo de Tarcísio não é o de demitir auxiliares diretos no olho do furacão. Lembram que ele manteve Renato Feder na Educação no início do mandato, quando ele determinou medidas atabalhoadas, como a eliminação dos livros físicos na rede estadual. Hoje o secretário teria se firmado, dizem esses aliados, e a pasta deve começar a mostrar bons resultados em breve.
Pessoas próximas a Tarcísio dizem que o secretário de Segurança, diferentemente do da Educação, tem um projeto político próprio, que nem sempre coincide com as diretrizes do governo. A tentativa de mantê-lo seria a de trazê-lo para essa nova "régua".
Na intervenção branca, está em estudo a retirada das corregedorias, sobretudo a da Polícia Civil, de dentro das polícias, para ficarem direto na secretaria. Apesar de os casos que ficaram notórios nos últimos dias serem todos da PM, a avaliação no Bandeirantes é de que a corrupção e a infiltração do crime organizados são mais graves na Polícia Civil que na PM. Tarcísio vai cobrar acesso aos processos em andamento na corregedoria e pretende estabelecer prazo para sua conclusão.
Resta saber como Derrite e a ala mais radical do bolsonarismo vão reagir a essas medidas, caso Tarcísio avance mesmo numa tentativa de mudança de rota na segurança. Aliados do governador garantem que ele não está disposto a comprar o discurso de que "bandido bom é bandido morto", ainda que ele tenha adesão no eleitorado bolsonarista-raiz.
Até a eclosão da atual crise, o discurso do governador era diferente, justamente de endosso ao que vinha sendo feito. A linha agora será a de manter a defesa do combate à criminalidade e à garantia da "segurança jurídica" para que a polícia enfrente sobretudo o crime organizado, mas sem que isso seja confundido com "endosso" ou "salvo-conduto" para a letalidade policial.
O Globo
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