O interesse do PT em colocar o nome do ministro na urna tem uma justificativa: sem ele, o partido e Lula correm riscos
Por Heitor Mazzoco
Na eleição de 2022, Fernando Haddad foi o político que chegou mais longe na tentativa de colocar pela primeira vez o PT no governo de São Paulo. Acabou derrotado por Tarcísio de Freitas no segundo turno, mas colheu 45% dos votos válidos e, com 11 milhões de eleitores, ajudou Luiz Inácio Lula da Silva a vencer uma eleição apertadíssima contra Jair Bolsonaro. Às vésperas de uma nova disputa, o nome do hoje ministro da Fazenda voltou a ser cogitado nos corredores do petismo como alternativa para evitar um vexame no estado. Apesar de afirmar publicamente que não pretende disputar nenhum cargo no ano que vem, o último petista a vencer uma eleição relevante em São Paulo (de prefeito da capital em 2012) será pressionado a ir para o sacrifício e fortalecer o palanque de uma esquerda fragilizada no maior colégio eleitoral do país.
O interesse do PT em colocar o nome de Haddad na urna tem uma justificativa: sem ele, o partido e Lula correm riscos. Pesquisas mostram que o ministro é o único que conseguiria ser minimamente competitivo, mesmo em uma eventual revanche contra Tarcísio, que é franco favorito, mas pode optar por concorrer ao Palácio do Planalto. Outros petistas, como os ministros Alexandre Padilha (Saúde) e Luiz Marinho (Trabalho), não chegam a 10%. Outra questão é que o PT busca a cabeça de chapa para evitar problemas com seus aliados de esquerda, como ocorreu na eleição paulistana de 2024, quando abriu mão de ter candidato pela primeira vez para apoiar Guilherme Boulos (PSOL) - a avaliação é que a sigla ficou escanteada na campanha. A pressão por candidatura própria deve crescer após a eleição no PT em julho, que vai definir o comando nacional e os estaduais da legenda no país.
Esse tabuleiro eleitoral passa ainda pelos nomes do vice-presidente Geraldo Alckmin, do ministro Márcio França (Empreendedorismo), ambos do PSB, e de Boulos. Caso Alckmin componha a chapa presidencial mais uma vez (hipótese hoje pouco provável), há chance de Haddad e Boulos serem os nomes ao Senado, enquanto França disputaria o Palácio dos Bandeirantes, que ele já chefiou em 2018. "O governo sabe que a tática do bolsonarismo será fortalecer a presença no Senado, então é um espaço do qual não podemos descuidar", diz uma fonte do partido ao justificar a hipótese de o ministro da Fazenda tentar o Congresso.
No caso de Haddad ser o nome ao governo, será recomendado a França que busque novamente uma vaga de senador, que ele perdeu em 2022 para o astronauta Marcos Pontes (PL). A costura é difícil porque os aliados têm suas exigências. O PSB entende que o PT deveria apoiar França, que, em 2022, abriu mão da sua candidatura para abrir espaço a Haddad. "Da mesma forma que França fez um gesto e o PSB teve responsabilidade em assegurar a frente ampla em 2022, todos os atores vão ter a mesma responsabilidade para buscar o nome mais competitivo e que mais possa aglutinar forças. E o França possui essas características", diz um quadro do PSB.

OFENSIVA - Inserção do PL na TV: preços altos já são explorados pela oposição (./Reprodução)
O futuro eleitoral de Haddad será decidido, porém, mais à frente. Em Paris, no início deste mês, o próprio Lula deu a senha ao desconversar sobre a candidatura de seu ministro em 2026. "Você acha que eu seria louco de responder isso agora?", disse, emendando que a questão será resolvida no início do próximo ano. Embora essa seja uma possibilidade menor hoje, Haddad é visto também como um substituto de Lula caso o presidente não dispute a reeleição por qualquer motivo.
Não seria a primeira vez que Haddad seria convocado para o sacrifício político. Em 2016, enfrentou a onda antipetista que varreu o país durante a Lava-Jato e não se reelegeu na prefeitura paulistana. Em 2018, aceitou participar da aventura de Lula, que, mesmo preso, lançou-se ao Planalto tendo Haddad como vice. Com a candidatura do padrinho indeferida, virou presidenciável a pouco mais de um mês da eleição e perdeu para Bolsonaro. Desta vez, no entanto, teria que carregar para o palanque o seu legado como "czar da economia", até agora infelizmente marcado pelas derrotas sobre as contas públicas e tropeços na economia que poderão ser fatais na disputa eleitoral. Para ficar competitivo, teria de superar essas dificuldades em pouco tempo, já que precisaria deixar o cargo em abril do ano que vem. A margem de otimismo para uma virada fica cada vez mais estreita. Na quarta-feira 25, Haddad viu a Câmara derrubar o decreto de Lula que reajustava o IOF, um dos pontos centrais de seu esforço para tentar garantir equilíbrio fiscal.

PLANO - Alckmin e Lula: vice pode disputar outro cargo em 2026 (Valter Campanato/Agência Brasil)
Em meio a todos esses problemas e incertezas, Haddad mantém uma postura de prudência, focado nos desafios do ministério e sem falar como candidato. A ideia é não dificultar ainda mais a aprovação da sua pauta econômica no Congresso. "A prioridade dele é tentar entregar essas agendas, porque são fundamentais para o governo", avalia um líder petista. Na terça 24, Haddad destacou que considera sua missão a estabilidade da política econômica e, com isso, ajudar no êxito do governo Lula. "Tudo tem seu momento. Já participei de outras ocasiões (eleitorais), mas agora não tenho esse objetivo" disse.
Se quiser disputar algum cargo em 2026 - ou for convencido a isso -, Haddad enfrentará chumbo grosso. As inserções em rádio e TV de partidos como o PL e o PP têm batido na tecla econômica como trunfo eleitoral, especialmente a alta de preços e a insistência do governo em aumentar impostos. "O povão chama ele de 'Taxad'. Não somos nós da oposição. Tudo o que Haddad e sua equipe sabem fazer é aumentar gastos públicos e meter a conta no cidadão", diz o senador Jorge Seif (PL-SC). Para Yuri Sanches, diretor do instituto de pesquisas AtlasIntel, a visão dos eleitores sobre dados econômicos é muito influenciada por escândalos no governo e desajustes políticos entre Planalto e Congresso. "Entre abril e maio, houve uma piora da avaliação do governo, que atribuímos justamente à turbulência política e econômica, uma retroalimentando a outra, especialmente os desvios do INSS e o aumento do IOF. Tudo gera na cabeça do eleitor uma percepção de falta de alinhamento e incerteza em relação ao panorama econômico e fiscal do país", afirma.

OPÇÃO - França: ministro do PSB quer apoio do PT ao governo paulista (mepm/Divulgação)
A pressão para o capitão da economia deixar o barco em meio à tormenta tem a ver com o maior projeto do PT: reeleger Lula. Por esse motivo, a montagem de palanques nos estados visará mais a fortalecer a campanha nacional do que buscar vitórias eleitorais pontuais. O deputado Rogério Correia (PT-MG) lembra que a sigla deverá caminhar com Rodrigo Pacheco (PSD) em Minas e Eduardo Paes (PSD) no Rio. "A ideia é fortalecer as chapas de Lula ao governo, em aliança com os setores mais ao centro, para garantir candidaturas fortes ao Senado e vencer a eleição presidencial", diz. A questão é se a estratégia vai reeleger um presidente com popularidade baixa - 57% desaprovam seu governo, segundo levantamento do Paraná Pesquisas da última semana. "Não sei até que ponto esse palanque para o Lula estaria tão assegurado com Haddad, porque o problema maior, a fragilidade maior, é o próprio Lula", diz Rui Tavares Maluf, doutor em ciência política pela USP. Visto nos últimos anos como a grande aposta petista para ser herdeiro do presidente, Haddad tem pouco tempo para solucionar os maiores problemas econômicos até o término da atual gestão. Enquanto isso, a pressão política do partido pela presença do nome dele nas urnas tende a aumentar. Na Esplanada da atualidade, não há outro ministro com tantos dilemas pela frente.
Veja
https://veja.abril.com.br/politica/em-meio-a-dificuldades-haddad-enfrenta-pressao-para-ser-candidato-em-2026/